Por: J. Leal de Sousa
Juiz de Direito
Lição I – Visão geral do procedimento
O processo de recuperação judicial, não raro, causa espanto aos
operadores do direito; quiçá por se tratar de matéria específica e com
regramento ainda relativamente novo (Lei no 11.101/2005).
Apaixonado pela matéria, tomo a liberdade de tecer neste espaço
breves comentários, sem pretensão doutrinária-científica e sempre aberto à
crítica.
Pois bem. Nesta primeira lição, farei uma exposição geral e
objetiva do instituto. Um retrato aéreo, para depois conhecermos as
avenidas, ruas e vielas.
Hodiernamente, sob a égide da Lei no 11.101/2005, a
recuperação judicial apresenta-se muito mais administrativa do que judicial,
em comparação com o regramento anterior do Dec.-Lei no 7.661/45. Veja
que o juiz não decide sobre a concessão ou não da recuperação. Isto é
competência dos credores, em assembleia-geral. Hoje, o juiz dirige o
procedimento, decidindo tão somente as questões incidentais e reflexas.
Logo no início do procedimento, o magistrado defere o
processamento da recuperação, o que é muito diverso da concessão da
recuperação. Para deferir o processamento, o juiz verifica apenas a
regularidade formal do pleito, sobretudo a juntada dos documentos
relacionados no art. 51 da Lei no 11.101/2005.
Não cabe ao magistrado imiscuir-se no exame da saúde
financeira da empresa devedora (recuperanda): se necessita ela ou não da
recuperação; se há possibilidade de soerguimento ou não, etc. Estando em
ordem a documentação e os demais requisitos formais da petição inicial, o
deferimento do processamento se impõe.
No mesmo ato que defere o processamento, o juiz nomeia o
Administrador Judicial – auxiliar do juízo, de quem falaremos noutra
oportunidade. Também suspende o curso de todas as execuções contra a
recuperanda (bem assim a prescrição), pelo período de 180 dias. Estas
execuções não são atraídas para o juízo da recuperação; ficarão no juízo de
origem, apenas suspensas. Inicia-se aqui o procedimento de habilitação e
verificação de créditos, matéria que também nos ocuparemos
oportunamente.
Intimada a devedora (recuperanda) desta decisão, inicia-se o
prazo de 60 dias para ela apresentar o Plano de Recuperação Judicial, sob
pena de convolação em falência.
Juntado o plano, o juiz determinará a publicação de aviso aos
credores (edital), para que, em 30 dias, querendo, apresentem objeção ao
plano apresentado.
Não havendo objeção, o juiz homologará o plano apresentado e
concederá a recuperação judicial à empresa devedora.
Havendo, porém, objeção de credor, ainda que uma só, o juiz
convocará assembleia-geral de credores (que será presidida pelo
Administrador Judicial) para deliberar sobre o plano de recuperação.
Na assembleia o plano será votado por 4 classes de credores:
I – titulares de créditos derivados da legislação do trabalho ou
decorrentes de acidentes de trabalho;
II – titulares de créditos com garantia real;
III – titulares de créditos quirografários, com privilégio especial,
com privilégio geral ou subordinados.
IV - titulares de créditos enquadrados como microempresa ou
empresa de pequeno porte.
Esta última classe foi criada recentemente; antes tínhamos
apenas as três primeiras classes.
Rejeitado (ou melhor, não aprovado) o plano pela Assembleia-
Geral de Credores, o juiz convolará a recuperação em falência. Veja que há
um risco iminente para a devedora.
Aprovado o plano, o juiz o homologará e, de consequência,
concederá a recuperação judicial à devedora requerente, restando novados
os seus débitos.
Durante os 2 (dois) anos seguintes, o processo seguirá com a
fiscalização, pelo administrador judicial, do cumprimento do plano. Havendo
descumprimento pela devedora, o juiz convolará a recuperação judicial em
falência. Mas, não havendo inadimplemento ou mora neste biênio, a
recuperação será concluída, com a consequente extinção do feito e
arquivamento dos autos.
Insta consignar que o plano poderá prever parcelamento de
dívidas por mais de dois anos. Aliás, poderá prever pagamento em longo
período, v. g., 50 anos (não há limite). Isso não obsta o encerramento da
recuperação no biênio. Ocorre que estas prestações continuarão sendo pagas
normalmente. Em caso de mora, o credor buscará seu crédito pela via da
execução individual (noutro processo), ou poderá requerer a falência em
processo próprio, como qualquer credor não sujeito à recuperação.
Vale dizer: durante o biênio (trâmite da recuperação), a
inadimplência do devedor importará em convolação da recuperação judicial
em falência. Após este período (extinta a recuperação), o credor, munido do título de crédito novado, deverá buscar as vias ordinárias (no juízo
competente) para saldar seu crédito (novado).
Aparecida de Goiânia – Goiás
Contato: mag.jlsousa@tjgo.jus.br
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